quarta-feira, 30 de novembro de 2022

não era época para abacates



uma filha de cabelos sem rumo

esvoaçante como a crina do cavalo inventado avança a paisagem sem luzes.

uma mãe debaixo de um teto azul recorta massinhas de modelar para o retábulo da filha,

aqui tudo vira ornamento: pote de água com papel crepom, colar de avó, carrinho minúsculo da china, papel toalha aquarelado do roxo mais marrom que existirá,

aqui tudo vira altar: choro estridente, peito sem leite, olho com remela verde.

subimos uma escadaria,

pulmões machucados e a filha com balões empunhados,

este caminho de amnésia, desenhos de planetas e o trinado do cavalo na boca da criança,

arrasto um cartão postal,

colo os últimos adesivos da guerreira de motonuí

não há carteiro, motoboy, nem renas,

arrasto a rua, a filha, o cavalo.

no chão de madeira velha

um vulcão esguicha gelatina vítrea, 

a filha chama o pai, a mãe chama o homem de pernas de pau,

mas o pai foi procurar abacates maduros e sem bolor.



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